segunda-feira, 31 de outubro de 2016

não tenho a menor pena de mim. quanto a você, sinta-se à vontade.

é tão difícil ser quem somos, que devíamos nos sentir realizados só por consegui-lo.

para Darlin  Muller

FELIZES PARA ABACAXI!



É um tanto complicada a história do sacolão. Escolhia frutas. Bananas, maçãs. As bananas estavam apodrecendo. As maças; gosto das durinhas. Mal maduras.
"Eu daria minha vida por uma sacola maior e você, menina. Eu te amo. Vamos com as frutas?". Cartei milha melhor cantada, "seremos felizes para abacaxi!" A princípio, fez pouco alho de mim. Mas ao cruzarmos o caixa teve ciúmes moranguinhos d’eu numa caixa tão bonita.
Eu sabia que poderia apaixoná-la ouvindo "Habanera", porém os CDS estavam todos numa mistureba dos diabos. Liguei a máquina de lavar e nos abraçamos gostosinhos no frio da uva. Julho.
Domingos, calçávamos frouxos chinelos de dedo e ,ó!, beira do córrego. Lá tiritávamos, tirava os chinelos e pés nas pedras geladas no fundo da corrente.
Era um mago quando as couves enverdeceram e o CD dos tenores sobre a mesa tosca de madeira. Uma imagem de Santa Maria rogava olhos miúdos por nós pecadores? Olhávamos saudades em fotografias: julho suspirava-nos. Amenos feito brisa e folhas.
Ganidos no quintal: chegou coelho, nosso cão branco. Comia tortas e o que comíamos. Corria atrás das crianças brincando. Depois que vi que era engraçadamente torto e o rabo como lhe pesava às vezes.
Belo dia chego em casa, as luzes apagadas, ela chorando mil cebolas. Um feijão bafejava quase toda a rua. Ela ouvia "Habanera". Pensei, "mexerica dos “tumatis”!".
E nos reapaixonamos edredons e fronhas frescas melancias que era tempo. Fresca de orvalhos ela me esperava branca espontânea nuvem.
Os lençóis- rosas esmaecidos -, não sei como posso tê-los reminiscências d’ontem tão ontem mesmo; e tudo era claro. Ela discreta de mil sussurros coniventes.

Limões que C vitaminem!

vestia-se bem para que quisessem despi-lo!

esta coisa de procurar o profundo me parece tantas vezes mais não querer ver o real. que temos a ver com "o que as coisas são", esta tentativa não se satisfaz com o que aparece.

não sinto falta de minha juventude, talvez saudade de ter pouco passado.

ENTRE NÓS

Para nos relacionarmos, por natureza, colocamos algo entre nós. Relacionamo-nos com copos entre nós, com Deus entre nós, com uma música entre nós, relacionamo-nos até com outras pessoas entre nós. Os objetos de interesse comum são nossa sintonia. Quando nos relacionamos diretamente um com outro, gozamos, às vezes até nos reproduzimos; isto é, se esta relação direta com outro não é um modo de interagir com um terceiro.

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

a dor de alguém.






como é difícil ser alguém!

ver o sol se pôr e se dispor ao tempo.




olha a despreocupação do alvo

no seu centro mesquinho

e a mão trêmula do arqueiro!




é mesmo triste ser alguém

em lugar de fumaça que sobe

sem se angustiar

ou pretender arte da sorte

ou temer qualquer mistura

sem zelo avaro pela forma

sem vontade que de com a cara no acaso.




ai! alguém entre construções,

à procura, permeando ruas, becos e vielas

sob o julgo de olhos, ouvidos e narizes.

sentidos vigias de mãe e de cães famintos.




olha a indiferença da garrafa

nas borbulhas que solta afogada!




como é duro ser alguém

e ter o hálito horrendo dos dias que amanhecem

postar sorrisos e cumprimentos fatídicos a alguns

indecente, remetê-los vazios de intenção.




é duro demais!




atravessar intacto críticas e trânsitos

dos que também atravessam na transversal

carregando crenças até das descrenças.




ah! vê o líquido

- cicuta ou elixir -

e o recipiente impassível ao gole.




ah! vê o descaso do crivo:

à bala perdida que venha parede

ou a carne de uma infância.




ah! vê a poesia sem ânsia de ser lida

como o livro é aos olhos que permeiam:

indiferente à página que atingem.




ai, que duro então não é ser gente:

angustiar-se na consciência da morte!




ser gente de negócio então...

programar montantes

borrando o papel com a tinta da vida

de enfileirar algarismos.




amargo! até que nos fechem em féretro

e o primeiro verme nos promova a algo.

o primeiro furo sem dor, sem pose,

sem contrações de carne, sem pudores sapiens.




sem alvoradas

não abusa mais de nós o amor:

tenor do canto dessa majestade

subjugando-nos a ninharia.




olha essa coisa corriqueira:

"a moça na janela

enquanto ela aguarda

o príncipe pelas vias atrás dela

à janela carcomida tanto faz

se ou se não por seu vão algo acontece.







aaah! que faz o remorso dos seres de atitude,

os pensamentos, as culpas...?




como é pecaminoso e doloroso ser alguém

invés de algo.

sujeito "engano" objeto.

"encontrar um sentido para vida"  partem à procura, quando esteja tão claro de que se trata antes de "inventar algo em que se possa acreditar. o que implica que "o sentido" dependeria antes de um "dom de iludir-se", "enganar-se", de "poder acreditar naquilo" do que de "desvendar uma verdade". os profissionais tendem a fazer de suas profissões, para melhor aceitá-las como destino, as mais importantes do mundo, há anedotas a este respeito! não nos percamos, se me dizem "encontrar", o hálito é de quem acredita que a Verdade vai salvá-lo, que há algo encoberto que precisa ser desvelado e que é a cegueira que nos impede alguma perfeição, definição. mas não seria exatamente uma "ilusão verossímil", quiçá uma "falsa descoberta" como as religiosas, o que nos possa tornar salutares, o que nos poderá dar um sentido para a  vida?

terça-feira, 18 de outubro de 2016

as pessoas mais bonitas são as capazes de solidão.

DELICADAS: almas muito cultivadas, almas que dependem muito de cultivo. na selva não vingam. murcham. encolhem-se. não possuem a crueldade necessária para entregar ao outro. e mesmo com esta ideia já se assustam.

sou um homem construindo um ninho. não me entendem os pássaros em revoada. eu que para cá voei, cada alma que encontro, tento com ela construir um país. quero ir fundo, embrenhar-me. será a carência o primeiro impulso psicológico?

Almas belicosas

Há almas que se tentam fazer e encontrar como opostas a outras. Se elevam em contrapor as demais, sejam amigos, namoradas, irmãos... Arregalam os olhos para lhes encontrar algo condenável. Para achar no outro um mal, aguçam os sentidos, provocam se detendo em pequenos gestos ou pequenas palavras de um largo contexto, ainda que estas palavras sejam algo como um apêndice inútil ao fluxo principal de um discurso. Parecem almas que enxergam o mundo e a vida como uma tirania absoluta, a tirania de um Deus, tamanha, que já não podem escapar, e então querem se tornar elas mesmas almas tiranas, para que levantam a voz, e de cada conversa querem erguer a bandeira de uma superioridade. De maneira que assim as demais almas lhes parecem fazer o mesmo quando isto ou aquilo observam em sua postura. É difícil, senão impossível, ter com tais tipos uma amizade que se aproxime em sinceridade. Sua competitividade constante pela posse de uma verdade repele aqueles que compreendem que em tantas questões há apenas pontos de vista.

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

tento não remedar estilos ao remediar silêncios

MIRAGEM


onde a gente faz falta é miragem

https://www.instagram.com/reel/COAmGVVHe5s/?utm_medium=copy_link
“amor” eu não sei

tenha engolido no choro

no soluço

e o amor não se evacua

não se pode algo cuspido

ficou aqui dentro prisioneiro

não sei

me roendo




de que se abstrai?




vi palavras em closes

bocas carnudas

mil tesões me escalaram

cálices que brindam

vi lençóis e filhos

lágrimas me fugiram

e me comovi de não achar o amor

e talvez fosse amor isto

nem sob nem sobre a cama

de todos os dias e noites

e todos os corpos úmidos oferecidos




lambi as angústias

tateei fios

cortantes

as literaturas

mas não achava

e sacrifícios e ouvi alardearem

“desnorteia e norteia as vidas”

“amor”, o que era?




enxuguei lagos de romantismo

e devo admitir torácico e estomacal

no vão que deixa a alma que me falta:

“amor” não sei




ocorreu-me inventá-lo

por amor?

ocorreu-me versá-lo

chegaram mesmo a concordar comigo

nessas tecnologias




amor

de que se abstrai?

uma vontade louca da existência do que se ausenta

nem do cume febril “amor” não sei




foi plenamente ignorante do que seja o amor

que menti e disse que amava e que sabia o que era

era vontade de tê-lo tão convicto

feito adolescente o ressoa firme

e trêmulo a que lhe acreditem

era necessidade de me achar generoso amando

me perdoem: eu não sei e não sabia

não peço desculpa de que tenha me esquecido




chamei de amor as frustrações maiores

ou os casos mais intensos que tive

ora! foram mais intensos os mais frustrantes

e fui assim os vestindo nobremente

“amor”




mas “amor” não sei

sou incompetente!




é que sempre precisei dizer que o sabia

para não passar de ridículo

e para que por amor não me odiassem

mas não sei

confesso desertor da farsa




sim! abracei minha mãe

fui de beijos e de pegar em mãos

e agora penso

vendo quão ignorante sou e me resta ser

que dissimulava

chorei meu pai morto

e tudo aquilo até parecesse "amor"

mas eu não sabia




feito um macaco faria

capaz que amei e não sei

e diferente do macaco que só amaria ou não

despreocupado

eu nunca saiba

porque não sou nisso de amor de sabedoria




sei que caravelas chegaram ao brasil

que existiram dinossauros

mas se amei foi sem saber o que fazia

sem poder pensar duas vezes antes

completamente ignorante




não é verdade

meus amores

é só necessidade de dizer

eu nem sei se sei ou se não sei

ou se acertei no amor esta flecha de entusiasmo e agonia

se acertei no amor tudo que sou e não sei

e em tudo que o neguei espero ter errado


a verdade não precisa de crentes

em convívio:

com tudo que é ruim se acostuma;
com tudo que é bom se enjoa.
ela quase chora dizendo:
- você mente?
- mas não é indecente este tom que você emprega ao dizer? não será mentira essa sua pergunta que, me parece, não quer saber?

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

terça-feira, 11 de outubro de 2016

escrever é uma espécie de ordem, disposição que inveja um deus. aquilo que se saiba seja muito pouco! demoramos muito tempo para saber, subimos muito alto ou cavoucamos demais para o fundo. muita terra jogada fora, restara talvez uma pepita que nos chame a atenção. o saber fica ali, no cume de um monte de esquecimento. de todos nossos atos do dia, poucos são frutos da sabedoria. dançamos conforme os buracos. escrever é uma espécie de arranjar-se. de terapia. é um jeito de lidar com tanta sujeira ideal.demorei muito tempo, tive de subir monturos, para cravar a bandeira nisto. escrever é uma espécie de ordem, não para quem procura, mas para quem se encontra perdido.

PROFESSORES DO GOSTO

Como que uma antipatia nos redesenha um corpo! Como de relance, por uma agressão que nos cometa um julgamento, uma figura começa a condizer com o que há de ofensivo! Uma simples noite em que ouvimos desaforos de uma pessoa qualquer é capaz de nos provocar pesadelos e nos tornar incapazes de ainda separar no agressor o que há de infame e admirável, incapazes de entender o momento do outro como atenuante num primeiro instante. Como, num segundo e terceiro instante, em que nos encontramos mais serenos, ele, corpo e alma, ainda está atrelado ao grosseiro! Como antipatizamos então com a distância da orelha ao queixo, da cor de pele, da cor de cabelo, da extensão de uma boca, do contorno dos lábios, do sorriso, do caminhar, das roupas últimas em que o lembramos, dos seus assuntos prediletos! Como queremos nos afastar do alcance de suas mãos, como distar dele se torna nosso prazer... Ele agora é reinterpretado por nossa sisudez, nosso rigor e impaciência. Se havia um traço dele que poderíamos julgar feio, algo que a amizade ou um bom afeto insistia em ignorar ou mesmo atribuir graça de originalidade, o traço então nos apareça torto e indesculpável, tudo nele se perde, tudo se torna grotesco. O defeito no agressor se torna um merecimento, e um mal de que padeça nos evoca a gritar “Justiça!”. De maneira que, nossos agressores, ou nossos inimigos, ou adversários têm o poder de moldar o nosso gosto. Nossa definição do que é belo é o que ele não alcança, nossa definição do que é feio é o que se lhe assemelha. Assim também nossos mais queridos nos ensinem o que é beleza. 

terça-feira, 4 de outubro de 2016

por que escrevo?

retirando minha obra, sou extremamente desnecessário. erguida minha obra, torno-me apenas inútil.

amigo dos amantes

por vezes olho para os amantes - com verves exaltadas, embriagados de paixão - com admiração. sou feliz pela felicidade deles, que é uma felicidade possível do mundo, que é o sorriso do outro, um significado de forma de paz e entendimento humano. sei que um homem saciado é menos nocivo. mas vendo-os assim, do chão, tão tãos... não tenho a menor vontade de entrar na fila da montanha russa em que vão.

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

ei, cara, continue tentando a beleza. achando a beleza sua. não diga que ninguém está vendo. não faça pouco assim de você.

um sujeito bom mesmo?

é aquele que sabe que o mundo não lhe deve nada.
sobre a casa pequena você tem que falar no primeiro dia em que você sai da casa grande. a casa pequena quase que só cabe o que tem em nossas almas. o quanto de espaço amplia uma sala, o nosso amor? e o quanto um mesmo afeto a diminui? uma casa pequena é cheia de coisas quando em contraste com uma casa grande, ou seja, quando se sabe o que é uma casa pequena. uma casa pequena é fumar um cigarro beirando a chuva  porque sua mãe de 1933, na sala, não aceita o seu vício de apenas vinte três anos de idade. uma casa pequena, se tiver jardim, é só um vaso procurando o ângulo de luz de uma janela. mas a casa pequena mesmo é aquela em que só cabe a gente. a maior casa em que morei era a casa em que se esperava meu pai voltar do trabalho. a casa mais triste é grande como um deserto em que não há quem entenda sua vida como uma poesia. mas isto é só a voz de uma nostalgia. e a vida é muito mais do que sentir falta.