segunda-feira, 28 de julho de 2014

MAJESTADE

junte todas as suas dores, físicas e anímicas... como pedras, pérolas, as que mais brilham em sua memória... vamos!, aquele diamante... não ignore! faça uma joia! a vida passeia por aí enfeitada com essa coisinha, orgulhosa, num casual braço esquerdo... e quando achamos que já passou por muito, veja!, ela sacode a pulseirinha num chacoalhar de dar engulho, remexe-nos em náuseas. vaidosa, ela quer um cordão e um par de brincos, de pedras duras, escuras, engastadas em olhares alheios... que combinem com seu vestido, que façam inveja aos mais tristes. "essa moça casou comigo", diga! "eu casei com essa..." a ela devo tudo, "talvez convenha chamá-la de alteza". e ela só se ajoelha para receber a morte, e haverá de recebê-la como a coroa que lhe falta na cabeça.
Eu e a menina começamos a ter a linguagem do sofrimento. Só falávamos quando estávamos tristes. Quanto mais tristes melhor. Mais digno de resposta. Mais bonito. Embora, às vezes, nojento. Eu precisava ter uma cãibra pra ligar. Ela precisava ter um câncer pra atender. Nossa amizade foi ficando um bolo de coisas tristes: angústias, minha mãe cagando pela casa; doenças na família, covardias violentas... Não havia sexo, não havia palhaçada, porque éramos velhos. Tínhamos ficado velhos de surpresa. E sabíamos através de nossas cartas, tristes, molhadas, velhas, que éramos.